Análise do haicai "Romance"de Guilherme de Almeida

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Análise do haicai "Romance"de Guilherme de Almeida

Análise do haicai "Romance" de Guilherme de Almeida

Flávia Regina de Santana Evangelista

Data de publicação: 04/06/2014

 

      O haicai é de origem japonesa e teve aparição significativa nas letras brasileiras por via européia conforme o interesse que nele tiveram as vanguardas modernistas. O principal escritor que tornou o haicai conhecido no Brasil foi Guilherme de Almeida, nas décadas de 1930 e 1940 (FRANCHETTI, 2008).

      Apresentaremos a análise estilística do haicai “Romance”, de Guilherme de Almeida, observando seus aspectos estruturais, bem como os semânticos, que caracterizam o estilo no qual este foi elaborado.

       O haicai apresenta o seu tema sintetizado no título, Romance, que se refere ao envolvimento amoroso entre duas pessoas. Percebemos a metáfora do cruzamento das linhas do tear, pertencente ao destino, com os encontros que se dão na vida, neste caso específico, veremos logo em seguida que se trata de um encontro entre duas pessoas, que como o título sugere, se torna um romance, bem como o cruzamento das linhas gera uma união. Tal ideia é reforçada quando feita a comparação entre o cruzamento das linhas do destino e o cruzamento dos dedos quando se fica de mãos dadas, uma forte característica na nossa sociedade das pessoas que vivem um relacionamento amoroso.

E/ cru/zam/-se as /lin/has
no/ fi/no/ tear/ do /des/ti/no.
Tu/as/ mãos/ nas/ min/has.

       Em relação a sua estrutura, o haicai é formado por três versos tradicionais, sendo o primeiro e o terceiro pentassílabos, enquanto o segundo um heptassílabo, somando um total de dezessete sílabas poéticas. Segundo Franchetti (2008) os haicais inicialmente não tinham rimas, mas Guilherme de Almeida inseriu nas suas produções duas ri­mas: uma a unir o primeiro com o terceiro verso, e outra interna ao segundo verso, ocupando a segunda e a última sílaba. Tais características se apresentam no poema em análise, pois encontramos a rima externa nos finais do primeiro e últimos verso (linhas- minhas), rima considerada rica gramaticalmente, conforme Goldstein (1941), pois as duas palavras pertencem a classes gramaticais diferentes, um substantivo e um pronome respectivamente. Ainda percebe-se a presença das rimas internas no segundo verso, na segunda e sétima sílaba poética (fi/no- des/ti/no).
       O poema apresenta duas partes conceituais [versos 1, 2] + [verso 3], separadas pelo ponto final no segundo verso. Na primeira parte conceitual temos um sintagma verbal que corresponde à ação do cruzamento de linhas, e o segundo verso, constituído por uma locução adverbial, onde a ação do primeiro verso ocorre (no fino tear do destino). Há um corte em relação à primeira parte conceitual do haicai e a segunda, representado pelo ponto final no segundo verso. A ligação entre essas partes conceituais é feita de forma semântica, a partir da união da metáfora apresentada nos dois primeiros versos, e a ação implícita no último verso, que apesar de ser composto por um sintagma nominal, ativa em nossa mente o ato de dar as mãos. A partir de uma comparação entre as linhas do tear e os dedos das mãos, e o cruzamento de ambos, temos um sentido muito maior que é trazido de forma sucinta pelo título, o romance, que se trata da união de vidas.

     O haicai é um poema que traz de forma breve todo o valor poético contido nas palavras, e usando poucas destas, carrega em si temáticas que são profundamente abordadas a partir de uma reflexão a respeito dos seus sentidos. Sobre isso, para finalizar, se faz muito relevante a leitura de “O haicai”, também de Guilherme de Almeida, que apresenta uma abordagem metalinguística a respeito da produção deste gênero poético:

O haicai
Lava, escorre, agita

a areia. E enfim, na bateia,
fica uma pepita.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

FRANCHETTI, Paulo. O haicai no Brasil. Alea. Estudos Neolatinos, v. 10, p. 256-269, 2008

 GOLDSTEIN, Norma S. Versos, sons, ritmos. 14ª ed. rev. e atualizada. São Paulo: Ática, 2006.